Um turbilhão de sentimentos voando em um túnel escuro, produzindo lampejos como as luzes de um enxame de vagalumes deslizando uns contra os outros num fluxo constante e frenético. Essa é a sensação de ler o livro “Quem matou meu pai”, do jovem francês Édouard Louis, em que narra de forma autobiográfica a relação com o pai por meio de um recorte de acontecimentos da infância até os dias atuais. Aqui é possível acompanhar as palavras de quem sentiu culpa, vergonha, raiva, tristeza, medo e compaixão, quase tudo ao mesmo tempo.
Com uma narrativa quase desesperada, Édouard Louis expõe a confusão que sentia perante a sua não compreendida homossexualidade e a não aceitação do pai - que se mostra ambiguo nos sentimentos e na forma de amar o próprio filho. Ao mesmo tempo, o jovem francês aborda a degradação política da saúde de seu país com duras críticas aos últimos presidentes e ministros. Um olhar que vem de uma pessoa com origem marginalizada, e que vê na mentalidade conservadora da população local uma das armas mais crueis.
A forma da literatura aqui não há nada de rebuscado, e conta até mesmo com certa licença poética na maneira da escrita. “Quem matou meu pai” é um livro curto, que não chega a cem páginas, mas possui a urgência de quem precisa falar algo. E as palavras são belas e correm pelos olhos em páginas de um manifesto sobre a compreensão de uma dor, seu sofrimento e por fim a redenção. Publicado originalmente em 2018, o livro vale todo o tempo dedicado ao seu fim, e ele chega inesperadamente.
Por Janary Damacena